O que é a responsabilidade social de uma empresa? Mesmo que você nunca tenha parado para pensar na definição, é provável que tenha ideia do que se trata. Em geral, são ações sociais que as empresas tomam para melhorar a vida das pessoas em seu entorno. Ou, pelo menos, para não piorá-la. Mas será que essa definição é precisa?
Dentre essas ações sociais, podemos citar alguns exemplos:
- Ao se estabelecer em uma área pobre, a empresa constrói escolas ou postos de saúde para atender a população local;
- Na época do Natal, presentear crianças na favelas – ou dar ovos de chocolate na Páscoa;
- Construir obras viárias para desafogar o trânsito causado pelo empreendimento;
- Distribuir cestas básicas;
- Construir campos de futebol em áreas carentes;
- Não empregar trabalho infantil;
- Revitalizar praças e parques;
- Custear cadeiras de rodas para deficientes pobres.
E diversos outros exemplos. São ações indiscutivelmente boas, com efeitos bons. O assunto da responsabilidade social das empresas evoluiu muito nas últimas décadas e não há dúvidas que as empresas modernas se preocupam com o tema.
Mas será que esse tipo de ação é realmente responsabilidade social da empresa? Veja que a questão não é o conceito, mas apenas a definição, o acordo semântico sobre a palavra responsabilidade.
Se revirmos os exemplos de ações sociais citados, percebemos que têm uma coisa em comum. Aqueles que não são meramente responsabilidade legal (ex.: não empregar trabalho infantil) derivam de deficiências do agente primário, normalmente o Estado. De quem é a responsabilidade pela Saúde, Assistência Social e Infraestrutura Urbana? A empresa cumpre com suas responsabilidades legais, tributárias e econômicas, junto ao governo, clientes, fornecedores, acionistas e outros stakeholders. Seriam as ações sociais realmente obrigações da empresa, no sentido que a palavra responsabilidade traz?
A situação real é que o Estado, por incompetência, negligência ou qualquer outro motivo, muitas vezes não é capaz de proporcionar o desenvolvimento social esperado. Quando a empresa está envolvida nesse processo, ela aparece como um ator culpável. Sua omissão é vista como irresponsabilidade. Mas, primariamente, o assunto não era de sua responsabilidade. Não foi a empresa que causou a pobreza do pequeno município onde se instalou, por exemplo. Porém, se ela estiver ali e não fizer nada para melhorar a vida dos habitantes ao redor, embora não esteja cometendo atividade ilegal, será mal vista.
Para não ser mal vista, a empresa precisa fazer um investimento social. Investe, por exemplo, em escolas, creches, postos de saúde. Extrapolando um pouco, a empresa pode tomar essas ações mesmo quando não tem o risco de ter sua imagem corroída. Neste caso, o investimento social estaria criando um diferencial para a empresa. Ela será vista como uma empresa – uma marca – que se preocupa com o bem estar social das pessoas em seu entorno.
Neste prisma, as ações sociais da empresa parecem realmente muito mais investimento social do que responsabilidade social. Responsabilidade implica obrigação, investimento envolve retorno. A discussão é análoga a se discutir se filantropia e caridade são obrigações do cidadão. Ou melhor, se não fazer filantropia se configura em uma ação não ética. Doar aos pobres sem dúvida é uma ação divinamente boa. Mas, e não doar? Levando ao extremo, estamos o tempo todo não doando – sempre poderíamos fazer mais. Estamos desta forma sendo não éticos? Parece-me que não.
Novamente, esse texto tem um foco específico no termo responsabilidade e seu significado. Em relação ao conceito que normalmente chamamos de Responsabilidade Social, poderíamos chamá-lo de Investimento Social Privado, talvez de forma mais precisa. Focamos aqui na pessoa jurídica principalmente perante a lei e suas obrigações.
Mas há um contraponto que considero importante. O Estado é ineficiente, incapaz ou incompetente. Isso é fato, é a realidade que vivemos. A empresa não pode se abster desta realidade. Se tem condições de ajudar a transformar o mundo, melhorar a vida das pessoas e criar uma sociedade mais equânime, deve fazê-lo. Do contrário, a empresa corre o risco de se tornar cúmplice da imperfeição social ao seu redor. Não é uma responsabilidade, mas é um pouco mais que apenas investimento em busca de retorno. As empresas contemporâneas já não são mais aquelas entidades psicopatas de outros tempos, que não distinguiam entre certo e errado, tanto que estivessem dentro da lei. A empresa atual tem muito mais traços humanos, não apenas da personalidade da marca, mas dos valores e princípios de que a controla: seus acionistas. E a manifestação desses valores bons e justos é o que se espera delas. Ética com participação.
Não sou especialista no assunto, mas gosto de dar minha contribuição. Esta é apenas minha interpretação sobre o debate que tive o prazer de participar na aula de Governança Corporativa e Gestão Sustentável, magistralmente orientada pelo professor Eduardo Rosa Pedreira.